Água da Bica ou o Curioso caso de Cinda Boca Doce

Um casal de amigos veio a morar em São Paulo. Naturalmente de Elias Fausto, Deo Juvante, uma cidade do Interior de São Paulo (ou Sampa), conhecida por ter sido batizada após o falecido e respeitado político Elias Fausto Pacheco Jordão, que infelizmente morreu antes do término de seu mandato como deputado.

                Quem conhece Elias Fausto ou mora lá não quer saber de ir pra outro lugar, mas Netinho e Derci foram obrigados a se mudar, devido a empresa que Netinho trabalha ter aberto filial na Capital.

                Pessoas influentes na comunidade Eliasfaustence, foi com muito pesar que deixaram sua querida cidade para trás. Mas levaram consigo as boas lembranças e a empregada de confiança Lucinda, que na cidade era conhecida por todos como Cinda Boca Doce. Uma graça, ajudava qualquer pessoa e saía em defesa de todos.Não falava mal de ninguém, muito pelo contrário, só tinha elogios. Teve uma certa vez que Netinho e Derci queriam fazer um churrascão daqueles pra uns chegados e pediram a Cinda Boca Doce que preparasse a carne. Reza a lenda que aquela carne foi salgada com as lágrimas de Cinda.

                Alguns anos depois Cinda ganhou uma bolada e voltou a Elias Fausto para fundar a primeira associação Vegan de Elias Fausto, infelizmente devido a falta de aderência, Cinda mais tarde reverteu o espaço para uma churrascaria, vive bem, rica e é dona de metade da cidade.

                Mas à época Cinda Boca Doce ainda trabalhava com Netinho e Derci e os três vieram, então, para São Paulo.

                Não demorou muito e já estavam bem instalados. Netinho ia todos os dias para empresa e Derci não queria ficar entediada em casa e abriu uma modesta boutique onde vendia bijuterias finas a preços módicos. À época Derci ficou muito perturbada da vida, pois quis dar o nome de Morgana a sua loja, mas a empresa que aplicou o nome esqueceu o G. Hoje tem loja em tudo que é canto, mas na ocasião deu uma senhora dor de cabeça a Derci pra explicar toda vez essa história.

                Todos os dias que chegavam em casa eram recepcionados com o sorriso bondoso de Cinda e também com um copo d’água que ela lhes trazia numa bandeja de prata, dada pela sogra de Derci que sempre fora motivo de discórdia na família pelo fato de Márcia, a irmã de Netinho, ter achado que ficaria com a bandeja de sua mãe.

                Dia após dia essa rotina se seguia: os dois chegavam em casa e Cinda vinha com o copo d’água pra eles.

                É verdade que a água possuía um sabor diferenciado, algo com um je ne sais quoi e que intrigava Netinho, mas principalmente Derci.

                Um dia os dois estavam se preparando para dormir e o assunto Cinda veio:

                - Nossa Tinho, a Cinda até que se adaptou bem aqui, né?

                - Por demais da conta.

                - Ai, cê sabe que eu acho uma chiquesa quando a gente chega em casa e ela chega caquela águinha pra gente? Acho um must.

                - A Cinda é muito gente, pessoa do coração bom! Ainda bem que ela aceitou vir com a gente.

                - É verdade Tinho, mas eu fico pensando o que ela coloca naquela água. Ela tem um gostinho diferente, eu não sei o que que é, mas parece que ela põe alguma coisinha pra deixar um saborzinho.

                - Ara, é só perguntar pra ela.

                E foi isso mesmo que Derci decidiu fazer no dia seguinte. Muito embora estivesse maravilhada, o sabor da água e sua origem pediam por sua atenção.

                No dia seguinte Derci chegou em casa e logo veio Cinda com o copinho d’água.

                - Dona Cici, aceita uma aguinha?

                - Ai menina, eu aceito. To mais cansada que bezerro solto no pasto.

                Derci bebeu um gole de água.

                - Ô Cinda, vem cá. Deixa eu perguntar um negócio procê. Essa água aqui tem um saborzinho diferente, né? – disse Derci sorrindo. – É água com o que, hein?

                - Não é com nada não D. Cici, é água da bica mesmo.

                - Ah, entendi. Nossa, refrescante, né?

                Cinda se retirou e Derci bebeu sua água normalmente. Mais tarde quando seu marido chegou comentou o ocorrido com ele, que recebeu a história com estranheza, pois ele queria saber que bica era essa. Derci também não sabia explicar.

                No dia seguinte os dois foram perguntar a Cinda sobre essa fonte.

                Muito impressionada ela achou que não se passava de uma brincadeira dos patrões, já que eles mandaram instalar aquela fonte. Ainda sem entender Tinho e Cici pediram que Cinda os levasse mesmo assim à fonte. Então com a bandejinha de prata debaixo do braço Cinda os levou à fonte.

                Ambos então olharam Cinda se dirigir até o banheiro e abrir o registro do bidê que Derci mandara instalar.

                - Aqui gente, a biquinha da onde eu pego água. Ai, é tão linda Dona Cici, a senhora tem é muito bom gosto mesmo.


                Hoje a churrascaria de Cinda é um point em Elias Fausto, onde a água é cortesia e os clientes podem se servir a vontade numa fonte no centro do buffet.

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